(O urubu e a cigarra)


O urubu e a cigarra
- © Lenise M. Resende -
 
O urubu comum é uma ave feia que voa bonito. Seu voo é tão bonito que chama a atenção de quem costuma olhar para o céu. E eu sou uma dessas pessoas.

Sou capaz de ficar horas seguidas admirando a cor do céu, e as nuvens mudando seu desenho, conforme o vento sopra lá nas alturas. Só não sou capaz de ficar horas seguidas admirando o voo dos urubus, porque eles não ficam muito tempo no mesmo lugar.
 
O show deles é rápido: um deles aparece planando no céu, logo outro vem chegando, e mais outro. Quando o bando se reúne, eles voam em círculos, procurando alimento. Dependendo do lugar onde estão, fico imaginando se tem algum lugar lá no chão onde podem encontrar algo comestível.

Em geral, é alarme falso, porque o bando vai mudando o círculo de lugar. E, quando menos espero, um deles se afasta planando. Logo outro segue o mesmo caminho, mais outro, e o círculo se desfaz.

Muitas pessoas que dizem apreciar o voo dos urubus moram em andar alto. E é aí que mora o perigo! Em São Paulo e Brasília, os urubus estão colocando ovos nas varandas dos apartamentos, e atacando os moradores. Apreciar o voo dos feiosos é uma coisa, mas dar de cara com um deles é outra.
 
Não me parece possível que um urubu pouse na minha janela. Que sorte! Por muito menos, quase morri do coração quando uma voadora feiosa, uma cigarra, pousou na minha janela.
 
Lembro que o dia começava a clarear, por volta de cinco horas da manhã, e a claridade me acordou. Como havia chovido no dia anterior, deixei um pedacinho do vidro da janela aberto, e também um pedaço da cortina. Mas, aquela amostra de claridade, indicava que o dia ia ser de sol bem forte.
 
Antes que eu decidisse se voltava a dormir ou fechava a cortina, ouvi um barulho de asas. Quase que imediatamente, a cigarra que pousou no parapeito da minha janela começou a cantar. E o resultado da cantoria estridente foi que levei um susto tão grande que, com o coração quase saindo pela boca, comecei a procurar por ela.

Felizmente a fresta da janela era bem estreita e, mesmo que quisesse, ia ser difícil ela entrar no quarto. Mas, por garantia, fechei a janela e a cortina, liguei o ar condicionado e voltei a dormir.
 
Por isso, fazendo as devidas comparações entre o tamanho do inseto e o da ave, não quero nem pensar no que aconteceria se um urubu pousasse na minha sorte, ou melhor, na minha janela.

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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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